A Raiz Antitomista da Modernidade Filosófica - 1ª Edição

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Descrição Geral

A despeito do que ainda hoje dizem muitos manuais acadêmicos, a Filosofia Moderna não nasce com René Descartes. Antes, a própria ruptura cartesiana foi preparada por séculos de erosão do pensamento metafísico tradicional; e, em particular, do pensamento tomista. O imanentismo subjetivista que caracteriza o pensamento moderno foi gestado longamente nas obras de autores medievais como Ibn Ruxd (Averróis), Siger de Brabante, Dietrich de Freiberg, John Duns Scot e Guilherme de Ockham, entre outros. Esses são os verdadeiros ancestrais da modernidade filosófica, artífices da “grande renúncia” que, segundo Julián Marias, caracteriza o período: a renúncia a possuir as coisas e o consequente contentar-se com seus símbolos. O divórcio entre fé e razão que herdamos desses homens formou o “caldo cultural” de que surgem essas duas dobradiças do mundo moderno: o Renascimento e a Reforma. Ora, as ideias que prepararam esses dois “eventos-matriz” eclodiram no cenário intelectual europeu precisamente no contexto do antitomismo que se seguiu à morte do Aquinate. Pode dizer-se, então, que a modernidade filosófica tem não apenas uma raiz medieval, mas uma raiz especificamente antitomista. Eis a tese que esta obra pretende apresentar – e, francamente, demonstrar.

Para expor tal tese em todos os seus desdobramentos, dividimos a obra em quatro partes. Na primeira, esforçamo-nos por apresentar uma síntese da filosofia de Santo Tomás, tarefa que o Angélico não empreendeu, mas antes delegou a seus discípulos. Nosso intuito foi mostrar que a chave de abóbada de tal filosofia é certa concepção metafísica em que o ser aparece, pela primeira vez na história, como actus essendi (como ato de ser), distinto realmente da essência nas criaturas e idêntico a ela apenas em Deus, que é Ipsum Esse Subsistens (o Próprio Ser Subsistente). Dessa ideia, em aparência singela, depende, em última instância, a possiblidade de fundamentação de um realismo filosófico consequente. E foi a contestação dessa mesma ideia, no conturbado post mortemdo Aquinate, que abriu caminho para a modernidade filosófica. – O restante do livro não é senão um exame das consequências resultantes da perda de tal compreensão metafísica.

Na segunda parte da obra, investigamos a natureza do pensamento moderno do ponto de vista especulativo, por meio do estudo das próprias obras de seus autores seminais.  Procuramos mostrar que a modernidade filosófica não é um fenômeno homogêneo. Duas correntes, com múltiplas variações internas, podem ser identificadas em seu bojo; e desde seus albores. Chamamo-las racionalismo e antirracionalismo. Cremos que tal discussão lança alguma luz sobre a problemática da “pós-modernidade”. A ideia de uma “pós-modernidade”, concebida seja como a superação da modernidade, seja como sua “liquefação”, à maneira de Zygmunt Bauman, deriva de uma concepção estreita do pensamento moderno – identificado unilateralmente com o racionalismo. Quando, porém, se contempla a modernidade de modo mais amplo, em sua bífida feição, percebe-se que a “pós-modernidade” é fenômeno cabalmente interno ao moderno; um recauchutamento contemporâneo de sua vertente antirracionalista.

Se o subjetivismo é o que caracteriza a modernidade filosófica do ponto de vista especulativo, é o liberalismo o que a caracteriza do ponto de vista prático, ou ético-político. Esse é o tema da terceira parte da obra. Distinguindo as várias camadas de sentido que se escondem por baixo do polissêmico termo “liberalismo”, procuramos mostrar a continuidade profunda que existe por trás do liberalismo econômico clássico (mesmo o da “melhor cepa”, de Adam Smith a Ludwig von Mises), o socialismo marxista e a revolução marcusiana que hoje forma a pauta mesma da esquerda internacional. Esperamos que tal investigação sirva para oxigenar o debate político brasileiro, que se condensa praticamente inteiro na enfadonha oposição entre os partidários do livre mercado e os partidários do Estado. Rogamos por que tal debate seja benéfico sobretudo para os católicos que se pretendem “liberais em economia”.

Na quarta e última parte da obra, passamos em revista aquilo que podemos chamar de “a tradição de críticas à modernidade”. Examinamos, de partida, a imensa “massa crítica” que se formou em torno do assunto quando o tema da “pós-modernidade” entrou em voga. E mostramos que toda essa discussão se encontra viciada na base por uma concepção míope do que seja a própria “modernidade”. – Mas examinamos também toda uma plêiade de autores cujas obras, embora incluam uma concepção mais ampla da filosofia moderna, malogram no arrostá-la, porque participam do mesmo antitomismo que, como vimos desde o princípio, é uma de suas raízes. É de uma legítima Filosofia do Ser que necessitamos para bem encarar o desafio moderno. E tal só encontramos na tradição aristotélico-tomista.

Ao fim e ao cabo, empreendemos toda essa discussão histórico-filosófica, porque estivemos preocupados, desde o início, com um problema de cunho espiritual, qual seja, a “crise do religioso”, tão típica do mundo moderno. E a conclusão geral a que chegamos quanto a isso é a seguinte: a restauração da fé no mundo depende – na escala humana, é claro – de uma restauração da inteligência. Sem dúvida alguma, a fé é virtude teologal infusa, ou seja, é graça. Ninguém precisa ser filósofo para recebê-la. Mas, como disse o Papa Leão XIII, em sua encíclica Aeterni Patris, a [sã] filosofia – e o Papa, neste documento, está a falar justamente do tomismo – pode ser considerada um “baluarte e como que firme fortaleza da religião” (DZ 3138). A posição teológica racionalista, que considera passíveis de demonstração as verdades da fé, é anticatólica; mas também o é a posição fideísta, que despreza o papel da filosofia como disciplina que aplana os caminhos para fé e em seguida ajuda a defende-la. A restauração e  a preservação da fé na sociedade moderna depende da existência de uma elite capacitada a manter viva a chama da melhor filosofia; significa dizer: de uma elite formada no aristotelismo-tomismo. Não porque a fé não seja dom, mas sim porque o dom da fé – que é como um tesouro que Deus guarda no castelo de nossa alma – precisa ser defendido com os muros, os fossos e os barbacãs da boa filosofia contra os ataques perpetrados pelos inimigos dessa mesma fé.

Daniel Scherer.

O autor

Nascido no Rio Grande do Sul, é doutor em Educação e mestre em Filosofia. Tem graduação em Psicologia, em Direito e em Teologia. Já atuou como professor de Direito, de Psicologia, de Filosofia e de Teologia. Hoje, dedica-se de modo especial ao estudo, à atualização e à difusão do tomismo.

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